balanciou, a coroa do rei, balanciou!"
------ CONTOS DO LALAU
25-06-2009------------
xô, xô, xô, meu zabelê
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Fico aqui a noite toda
Na década de setenta ainda havia, em Minas Novas, pelas manhãs, revoadas de andorinhas que, tão logo o sol subia a pino, elas se debandavam e sumiam todas, em direção do Mirante e, de lá, partiam em revoadas pelas bandas das veredas que ainda não eram contaminadas pelo eucalipto.
Voltavam todas, uma a uma, naquele alvoroço matutino, tão logo rompia o outro dia, fazendo suas incríveis evoluções pelos céus fanadeiros em arriscados vôos que nunca, em tempo algum, sucederam-se de colisões ou algum desses desastres aéreos comuns aos entes que voam, com seus lindos brevês, mas que sofrem porque não têm a habilitação própria e o conhecimento adequado da sabedoria de voar.
Milhões dessas aves de arribação, guiadas pelo cansaço, pousam algumas horas nos fios, de pouca energia, desenhando nos intervalos de postes, como barras, o pentagrama onde compõem roucas sonoridades que somente elas apreciam, enquanto pintam, no calçamento das vias públicas, lá no chão, curiosas figuras escatológicas.
Depois do meio-dia era a vez de outros aeronautas: canários, sofrês, fleuras, sanhaços, sabiás, pintassilgos,
E à tardinha, quando o sol mansamente ameaçava esconder-se por detrás do Morro da Contagem, já se descambando pelos lados do Buriti e do Capão do Serro, irrompiam-se das torres do Rosário, milhares de morcegos que, incomodados com a “ave-maria” do campanário, lembravam-se do compromisso de recolherem suas sementes na imensa Sapucaieira, ensaiando vôos rasantes nos espelhos d’água de ambos os rios que logo abaixo da Cadeia Pública faziam a Barra. E daquele ponto, numa azáfama impertinente, retomavam o sentido da nascente e voltavam, seguindo céleres, Fanado acima, em direção ao córrego do Manoel Luiz onde, certamente, nas locas daqueles lajedos, iam depositar os seus tesouros..
E à noite, sob o lúgubre coaxar dos batráquios, que invadiam as ruas, caiam do alto do poste de luz as aleluias, os siriris e as bruxas, para a dieta daqueles animais medonhos preferidos pelos feiticeiros na tecedura de seus despachos.
Sob o diáfano cortinado da névoa seca, na lusca-fusca de uma iluminação dengosa, encobria-se o vai-e-vem sorrateiro dos personagens da noite que, aos poucos, surgiam dos becos e ruelas, rumo à perdiçao e à jogatina, no boteco de Tião Preto, ora para uma bebericada na cotréia da venda de Finusca ou cafezinho negro da madrugada no Poleiro das Viúvas. Era esse o momento em que se ouvia, claramente, o colidir das bolas nos bilhares do Bar Avenida, onde a usura de Mário enchia-lhe as burras, esvaziando as algibeiras de Márcio, Idé, Taco, Zé Pereira e outros beócios das apostas.
Mais acima, da cozinha do “Pescoço Sujo”, exalava a fumaça que carregava o cheiro bom de uma galinha surrupiada, no tempero inconfundível de dona Alice, enquanto o vispora, o truco e a caixeta corriam soltos, sob o vigiar atento do grupiê Laudodó.
Do outro lado da rua, com suas imensas portas abertas até altas horas, como se fossem bocas a devorar os últimos vinténs da freguesia, mesmo sendo gélido o tempo e curto o cobre, fabricavam-se os sorvetes de coco e anis, colocando-se cera no batente da balancinha de pesar o ouro dos faiscadores, a esta hora meios bêbados e guardando no caborje a feira de um prato de farinha, uma libra de toucinho, uma medida de feijão bichado, um palmo de fumo de corda, uma garrafa de Gilda, meio queijo cozido, uma forma de rapadura e um quarto de requeijão cascudo.
Na porta do depósito de Zé de Frade, tendo lá no fundo a pocilga, de onde subia o insalubre furdunço e o ronco dos capados, entreouvia-se a afinação de um pinho que, tão logo terminasse a branquinha, plangeria com a paixão de Plínio, Toni Catitu e Luizinho, encantados com a Rua do Fogo, reduto de uma récua de menestréis e seresteiros, atraídos pelos chouriços e torresmos de Bina, de Eufrásia, de Rosa de Fulô, de Madalena ou de outras alcoviteiras que os depenavam e esfolavam juntos das piantes surrupiadas.
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A insônia neurastênica do Toninho Dodô, na vigília constante de sua amada Marinhinha, induzia-o ao trabalho noturno de remendão, ficando a noite toda lambendo a sola das precatas e das chinelas que seriam usadas pelas beatas domingueiras, as quais, no raiar do dia, na alvorada festiva, se encantavam com o toque do trombonista Moreira: pois a sua casa verdadeira era aquela moita, onde ficava a espreitar, entre as folhagens das buguenvileas, manacás, murta-flor e jasmineiros que durante o dia se prendiam os animais cargueiros e montarias dos fregueses de Zé Camargos, e à noite, ficando a sua tenda de soslaio, encobria-se com os córneos escuros, mesmo estando erma a rua, postando-se a vigiar a porta e a única janela da sala aguardando o retorno, que nunca acontecia, da esposa infiel que na esbórnea a avenida toda corrompia.
Alguns deles catavam ouro, em bateias negras de árvores centenárias, se as pepitas se apresentassem fáceis, outros, em cadinhos ardentes, forjavam durante o dia as joias e as alianças dos noivos eventuais, pois que raramente essas bodas aconteciam.
A névoa seca sobe pelas grotas laterais e Burrucha, Geraldona, Loura, Bastiana, Lurdona, Rosa, Laura, Zefa, Terezão, Pureza, Tonha, Lita, Lindaura e Andrelina, fartas do trotoá, de míseras colheitas, já se recompunham, das carraspanas, com o suco de cana encardido no copo-sujo do sovina Júlio Sena.
O dia já vai quase clareando...
Dão e Zé Soier, que silenciosamente ficaram na madorna, sem trocarem uma palavra sequer, durante toda a noite alisando o banco do Amparo, assuntando a resenha e a poesia muda das noites minasnovenses., agora se despedem:
- Boa noite, amigo Dão... o papo está muito “bão”, mas até mais logo...
- Boas, seu Zé Soyer; Lembranças à Contente... Até amanhã!
"...Cê chupa a cana e espinica o bagaço, minina bunita, mi dá um abraço:
Engém novo, tá moendo tá,
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As roletas do tempo são piorras inexoráveis, submetem-se apenas ao poder do grupiê e suas fichas que nunca caem fazem o desassossego das mulheres sérias, muitas poucas, que se levantam cedo para enfeitar os altares de tantos templos de antigos padroeiros carentes de rezas.
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Porém, já era tarde, pois delas restou apenas um casal que se arribou para as bandas da "mãe" África, de onde originaram as ancestrais, e de lá prometeram, pelo telégrafo sem fio, nunca mais voltar para compor novas partituras na fiação da luz dessa cidade de assustadoras acontecências, pois não era esta a primeira e nem a última.